Pesquisar este blog

segunda-feira, julho 24, 2023

ente

res

     pira

            profunda

                           mente

pau

       la

            tin[h]a

                       mente

des

      trava

               a

                  mente

doi

     diva

            na

                 mente

sábado, julho 01, 2023

Praça do choro

Aqueles últimos meses vinha sendo um inferno para Joaquim: a perda de um amigo, fim de um relacionamento e desentendimentos no trabalho. Tudo era triste e sem sentido. Mas havia chegado as férias, que, se lá atrás havia sido muito esperada e representava alegria, agora era mais um compromisso. Afinal não deixaria de ir, pois ficou dez meses pagando a passagem aérea, o hotel já estava reservado e teve que depositar cinquenta por cento das diárias. Inicialmente seria as férias do casal, agora iria sozinho, por isso era só mais um compromisso, pra não perder o valor investido, mas talvez fosse mais um acúmulo de tristeza.

E Joaquim se foi. A todo momento se perguntando por que havia escolhido como destino o interior do Brasil invés de uma cidade com praia ou mesmo uma capital, onde pelo menos poderia ter certeza das festas e bebedeiras. No final pensou: "Pelo menos bebidas se encontra em qualquer lugar".  Chegou ao destino e um pequeno carro veio buscá-lo para a cidadezinha onde ficaria seus 15 dias de férias. Ao ver o carro, arrependeu-se de ter vindo. Aquilo faria sentido se viesse com Lúcia, afinal tinham combinado que queriam ficar longe de tudo e de todos, meio que isolados... "mas agora, qual o sentido disso".

O motorista sorridente lhe perguntou: "Senhor Joaquim Flores?" Chacoalhou a cabeça  afirmativamente. O rapaz quis pegar sua mala, mas ele mesmo a colocou no carro. "Pronto para a viagem?" Apenas pensou: "Mais uma?" Se questionava mais uma vez qual o sentido daquilo tudo. Lembrou de Lúcia, depois do amigo que perdeu em um acidente, do inferno que vinha sendo o seu trabalho e do quão ruim seriam aqueles quinze dias naquele fim de mundo.

Durante o trajeto de pouco mais de duas horas o motorista tentou puxar assunto sempre com um sorriso, mas a resposta era sempre monossilábica ou apenas um meneio de cabeça ou ainda um olhar enviesado. Joaquim queria sumir dentro de si. Chegou ao destino, mais sorrisos de recepção - "Talvez eu seja o único hóspede" -, preenchimento de ficha e o quarto. Se quer tomou banho, pois estava tomado de um cansaço existencial, mas todas as preocupações fez com que rolasse na cama quase a noite toda. Quando o dia estava amanhecendo o cansaço venceu e conseguiu dormir. 

Acordou já tarde. Perdeu o horário do café, mesmo assim a recepcionista perguntou se queria que montasse uma mesa para ele. Pediu apenas um café. Engoliu rapidamente e saiu sem destino. Estranhou os olhares e meneios de cabeças que o cumprimentavam. Havia esquecido de como são as cidades pequenas. Queria sumir da vista de todos. Queria esquecer Lúcia e ao mesmo tempo saber o por que deu errado em sua relação... não queria voltar mais pro trabalho. Reclamava para si: "Toda a minha vida é uma merda!"

Parou de repente. Algumas poucas pessoas cruzavam por ele sem entender. Uma senhora parou à sua frente e disse que deveria ir até a praça ali próximo, lá tinha lugar para sentar. "Se vê que o moço precisa". Ele não respondeu e pouco entendeu o que a mulher falava, mas conseguiu visualizar seus gestos indicando a direção de algo que ele não sabia o que era, mas como autómato obedeceu e seguiu na direção indicada.

Era uma praça pequena e bonita. Havia uma fonte no meio; em um dos lados havia uma pedra grande e escura. Havia duas pessoas encostadas nela e chorando. Do outro lado, pessoas conversavam sentadas. Uma imagem surreal a seus olhos. As pessoas que conversavam do outro lado, a seus olhos, ignoravam as que choravam à sua frente. Joaquim não sabia o que fazer, tudo pululava em sua cabeça: Lúcia, trabalho, o amigo, a vida e aquele lugar.

Uma pessoa se aproximou. "Vejo que o moço não é daqui. Vejo também que está precisado de chorar. Olha, se quiser, é só encostar naquela pedra. Ela tá lá pra isso" e sorriu. "Depois, se quiser conversar ou só ter uma companhia, ali do outro lado, qualquer banco, é só sentar". Joaquim não conseguia agradecer, gesticular, nada. O verbo chorar, no entanto, em seus ouvidos foi uma senha esperada e uma espécie de última alfinetada em carne machucada. Tanta dor não cabia mais dentro de si. Cambaleou até a pedra, encostou e chorou efusivamente, desengarrafando um comboio de sentimentos guardados. Chegou mesmo a deitar-se no chão, sem medo e sem nenhuma vergonha, ninguém o reprimiu com palavras ou olhares. 

Após muito tempo, o rosto lavado por lágrimas, com pequenos soluços que iam aos poucos desaparecendo, ganhou coragem e atravessou a praça, sentando-se em um banco. Um moço sentou a seu lado, pegou sua mão e afirmou olhando generosamente em seus olhos: "Caso queira conversar, estou aqui. Se não, podemos apenas ficar aqui sentados, com a certeza de que pode contar comigo nesse momento". Joaquim nada falou, mas a certeza da presença daquele corpo afetuoso seu lado o encheu de nova vida. Permaneceu ali por bastante tempo, quando agradeceu com a cabeça e levantou. Voltou no outro dia e dessa veza, além de chorar, conseguiu falar.