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segunda-feira, outubro 21, 2019

Abayomi e limonadas


Baixinha e redonda. Cabelos brancos, pernas tortas e riso largo. A experiência dos anos e a prática diária na luta pela sobrevivência lhe havia dado uma habilidade incomum com objetos manuais. Dentre as coisas que mais gostava de fazer eram as bonecas abayomi. A boneca, vendida ou presenteada, sempre permite encontros preciosos entre a artesã e aquele que recebe. Dona Rosa lembra:

- Sabe de onde vem? Era das mulheres escravizadas que rasgavam seus vestidos para fazer bonecas para as crianças nos navios negreiros. Bonito, né?

E uma história emenda na outra, em mil e uma noites sem fim e sempre entremeados por risos.

- Eu não estudei muito não. Eu tinha vergonha. Lembro que quando era pequena e minha professora me ensinou a soletrar: c-ka, c-ke, c-ki, c-ko, c-ku. Ela falava “diz menina.” Eu vermelha, com vergonha. Aí ela me pôs de joelho em cima de caroços de milho pra me incentivar a leitura. Mas eu tinha muita vergonha de falar cu. Ela chamou minha mãe, que me deu uma surra por não obedecer a professora. Tudo por causa do cu.

E torna a gargalhar enquanto suas mãos não param de fazer as pequenas bonecas. Dona Rosa é daquelas que fazem limonadas de todos os limões que a vida lhe dá.

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