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quarta-feira, agosto 14, 2024

Urbs Dystopia

No coração da floresta Amazônica, onde o verde outrora dominava, ergueu-se uma cidade que parecia saída dos pesadelos mais profundos. Old Port, como fora batizada, não surgiu por capricho da natureza ou por necessidade humana, mas como uma criatura moldada à força, forjada entre o fogo e o ferro. Os ventos que um dia carregaram o cheiro fresco da vegetação agora sopravam fumaça, e as águas dos rios, antes cristalinas, corriam como se carregassem a sombra do futuro sombrio da cidade.

Old Port não era um lugar onde o progresso tivesse qualquer relação com o bem-estar humano. Ali, o desenvolvimento era medido pelo brilho metálico das estruturas que dominavam o horizonte, pelo rugido constante das máquinas que nunca descansavam, e pelo crepitar do fogo que, assim como a cidade, parecia indomável. Para que Old Port existisse, povos antigos foram forçados a deixar suas terras sagradas, expulsos pela ambição dos homens que viam na floresta apenas um obstáculo a ser superado.

A cidade nasceu do fogo que queimava a floresta sem remorso, transformando árvores centenárias em cinzas e ferro. As chamas que devoravam a vegetação também moldavam o ferro bruto, que, em estado líquido, dava forma às estruturas maciças e sombrias que compunham a espinha dorsal de Old Port. O ferro era a carne da cidade, e o fogo, o seu sangue. A cada dia, a floresta recuava, e a cidade se expandia, consumindo tudo ao seu redor.

As pessoas que habitavam Old Port não eram como as de outros lugares. Atarracadas e de estatura reduzida, pareciam carregar no corpo o peso do ferro que sustentava a cidade. Não havia espaço para crescer em Old Port, nem física nem espiritualmente. As crianças nasciam pequenas e doentes, e os adultos envelheciam rapidamente, como se o próprio ar da cidade sugasse suas energias. Ninguém vivia além dos trinta anos, e a morte era uma presença constante, quase familiar, na vida dos habitantes.

O fogo, que queimava a floresta, também se tornara parte do cotidiano. Em Old Port, o lixo não era recolhido; ele era queimado nos quintais das casas, alimentando a atmosfera de fumaça espessa que nunca se dissipava. O saneamento básico era um conceito estranho à cidade, onde a água potável precisava ser fervida ou comprada a preços exorbitantes. Farmácias brotavam como ervas daninhas, uma para cada mil habitantes, vendendo remédios que ofereciam alívio temporário para os males crônicos que afligiam a população.

Ainda assim, o paradoxo da cidade era visível nas ruas. As pessoas, embora doentes e envelhecidas antes do tempo, dirigiam carros grandes e potentes, que pareciam desafiar a decadência que os cercava. Old Port era uma massa cinzenta de ferro e concreto, sempre envolta em uma névoa de fumaça, onde o verde da floresta era apenas uma lembrança distante.

No restante do país, Old Port era vista com medo e repulsa. Não apenas pela destruição que causava ao meio ambiente, mas pela ameaça que representava para outras cidades. A cidade não crescia em população, mas em extensão, espalhando-se como uma mancha escura pelo território. As pessoas temiam que os hábitos de Old Port se infiltrassem em suas próprias cidades, que o fogo e o ferro se tornassem suas realidades.

Old Port era uma ferida que nunca curava, uma cidade que, em vez de crescer e florescer, apenas se espalhava como um câncer, devorando tudo em seu caminho. E, enquanto o fogo queimava e o ferro dominava, a cidade continuava a se expandir, levando consigo a escuridão que assustava até mesmo aqueles que nunca a tinham visto. O medo da conurbação se espalhava pelo país, e Old Port, como uma entidade viva e faminta, avançava lenta e inexoravelmente, ameaçando transformar toda a nação em um reflexo distorcido de si mesma.

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