Publicação de contos, crônicas, poesias e artigos escritos por Adailtom Alves Teixeira (em artes Adailtom Alves). Outras redes: https://linktr.ee/adailtom.alves
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sexta-feira, maio 31, 2024
dói teu abraço descuidado
teu beijo sem vontade
teu chegar querendo partir
dói tua ausência
em presença de mim
quinta-feira, maio 30, 2024
O tempo vincado em nossas faces
quarta-feira, maio 29, 2024
no verão amazônico
no verão amazônico
um rio de fumaça
denso, inunda o ar
há corpos e vozes
em luta, a gritar
balas velozes
segue a lhes matar
terça-feira, maio 28, 2024
Direito de amar
Na pequena cidade de Encanto,
onde as tradições e costumes eram rigidamente preservados, tudo mudou num fim
de tarde ensolarado. Na praça central, sob o olhar vigilante da estátua do
fundador da cidade, duas jovens mulheres, Marina e Isabel, compartilharam um
beijo apaixonado. Era um gesto simples, um ato de amor puro, mas naquele
contexto, foi o suficiente para abalar as estruturas da comunidade.
Marina e Isabel tinham se
conhecido na universidade local, onde Marina estudava literatura e Isabel,
música. A paixão por artes e a luta por um mundo mais justo as uniu, e logo se
viram inseparáveis. A relação delas, embora ainda velada para muitos, floresceu
em meio a conversas intelectuais, risadas e momentos de ternura.
Quando o beijo aconteceu,
algumas pessoas ao redor pararam para observar. Entre elas, Dona Marta, a
florista da cidade, conhecida por seu olhar vigilante e língua afiada.
"Mas que pouca vergonha!", exclamou, ao que rapidamente outras
pessoas começaram a concordar e sussurrar. Comentários maldosos se espalharam
como pólvora. "Isso é um desrespeito!", "Onde vamos parar com
esse tipo de comportamento?".
Logo, o burburinho chegou aos
ouvidos de Padre João, um homem rígido em suas convicções, que se sentiu na
obrigação de fazer um sermão na missa do domingo seguinte. "Estamos
vivendo tempos de depravação. O que aconteceu na praça é um sinal de que
precisamos nos voltar para Deus e para os valores que construíram nossa
cidade", disse ele, sem mencionar nomes, mas todos sabiam a quem se referia.
A notícia correu a cidade, e
Marina e Isabel, que inicialmente não tinham percebido a extensão do impacto de
seu beijo, logo se viram no centro de uma tempestade. As fofocas não se
limitavam mais às esquinas e mercados; estavam em todas as redes sociais, nas mensagens
de texto trocadas freneticamente entre moradores, até mesmo no jornal local,
que insinuava que a moral da cidade estava em perigo.
Ambas começaram a sentir o
peso do preconceito em suas próprias peles. Marina foi afastada de algumas
atividades na universidade e Isabel teve concertos cancelados. As ameaças e
insultos anônimos não tardaram a chegar. Contudo, no meio de tanta hostilidade,
a solidariedade também começou a surgir. Pequenos grupos de apoio se formaram,
compostos por amigos, colegas e pessoas que acreditavam no direito de amar
livremente.
Determinadas a lutar contra a
intolerância, Marina e Isabel decidiram organizar uma manifestação pacífica.
Usando as redes sociais, mobilizaram pessoas de toda a região para se juntarem
a elas na praça onde tudo começou. O evento, chamado de "Amor Sem
Barreiras", foi planejado para ser uma celebração do amor em todas as suas
formas.
No dia marcado, a praça de
Encanto se encheu de cores, música e diversidade. Casais de todas as
orientações, famílias, amigos e aliados se uniram para mostrar que o amor não
deveria ser um motivo de vergonha ou discriminação. Marina e Isabel, de mãos
dadas, subiram ao palco improvisado e falaram sobre a importância de respeitar
o amor e a individualidade de cada um.
"Não queremos nada mais
do que o direito de amar", disse Isabel, sua voz firme e emocionada.
"Estamos aqui para dizer que o amor é bonito, seja ele como for. E que
nenhuma tradição ou preconceito pode nos dizer o contrário." E nesse momento,
ao som de uma música especialmente composta por Isabel, conclamou todos os
casais a um longo beijo com seus parceires.
O evento foi um marco na
história da cidade. Apesar da resistência de alguns, a demonstração de união e
apoio foi um passo significativo rumo à aceitação. A partir daquele dia,
Encanto começou a se transformar. Lentamente, as mentes foram se abrindo, e o
amor de Marina e Isabel, outrora alvo de tanto preconceito, tornou-se um
símbolo de resistência e mudança.
E assim, em meio a uma praça que testemunhou tanto ódio, floresceu uma nova esperança. Uma esperança de que, um dia, o amor seria celebrado em todas as suas formas, sem medo, sem preconceito, apenas com a pureza que lhe é inerente.
domingo, maio 26, 2024
Um mundo a descobrir
O sol
do meio-dia ardia implacável sobre o sertão cearense, e o rio seco serpenteava
como uma cicatriz através da paisagem desolada. Francisco, um menino de apenas
dez anos, caminhava descalço sobre o leito arenoso do rio, sentindo os grãos de
areia quentes queimarem seus pés. A cada passo, o chão parecia vibrar de calor,
e o horizonte tremulava como um sonho distante e intangível.
Francisco
sempre fora um sonhador. Apesar das dificuldades de sua vida no sertão, sua
imaginação era fértil como a caatinga após as raras chuvas. Naquela tarde,
enquanto caminhava pelo rio seco, ele sonhava com outras vidas e outros mundos.
Seus olhos, tão escuros e profundos quanto o céu noturno, fitavam o vazio com
um brilho de esperança e curiosidade.
Ele
imaginava-se um explorador em um mundo desconhecido, onde o rio seco se
transformava em um vasto mar azul, com ondas altas e espuma branca. Sentia a brisa
salgada do oceano em seu rosto, e ouvia o som das gaivotas sobrevoando seu
barco imaginário. Francisco podia quase ver a linha do horizonte onde o céu
encontrava o mar, prometendo aventuras sem fim.
Em sua
mente, ele navegava por ilhas exóticas, cobertas de florestas densas e
habitadas por criaturas fantásticas. Havia dragões alados e fadas luminosas, e
ele era o herói corajoso que desbravava aqueles territórios inexplorados,
resgatando tesouros perdidos e desvendando segredos antigos. O som do vento nas
folhas das árvores misturava-se ao canto dos pássaros, criando uma melodia
encantadora que ecoava em seu coração.
De
repente, uma sombra cruzou o caminho de Francisco, trazendo-o de volta à
realidade árida do sertão. Era uma nuvem passageira, uma bênção momentânea no
calor abrasador. Ele parou e olhou para o céu, agradecendo pela breve pausa do
sol escaldante. A nuvem continuou sua jornada, mas a sombra que ela deixara
ainda persistia na mente do menino, como um lembrete de que a esperança e a
imaginação podem florescer mesmo nos lugares mais inóspitos.
Enquanto
retomava sua caminhada, Francisco avistou algo brilhando na areia mais adiante.
Correu até o local e encontrou um pequeno espelho quebrado, provavelmente
deixado por algum viajante. Pegou o espelho com cuidado, observando seu próprio
reflexo fragmentado. Seus olhos sonhadores pareciam mais brilhantes do que
nunca, refletindo a luz do sol e o vasto mundo interior que habitava sua mente.
Com o
espelho na mão, Francisco continuou sua jornada pelo rio seco, mas agora ele
tinha um novo objetivo. Ele decidiu que, um dia, sairia do sertão e exploraria
o mundo além das dunas e caatingas. Ele conheceria oceanos de verdade, ilhas
misteriosas e criaturas fantásticas. Ele seria o herói de suas próprias histórias.
O sol
começou a se pôr, tingindo o céu com tons de laranja e rosa. Francisco sabia
que era hora de voltar para casa, mas sua mente continuava a vagar por aqueles
mundos imaginários. Cada passo no caminho de volta era acompanhado por uma
promessa silenciosa: a de que um dia ele realizaria seus sonhos e mostraria ao
mundo que, mesmo sob o sol escaldante do Ceará, um menino pode encontrar
beleza, esperança e aventuras infinitas.
E assim, com o coração cheio de sonhos e os pés descalços sobre a areia quente, Francisco caminhou de volta para sua pequena casa no sertão, levando consigo a certeza de que o mundo é vasto e cheio de possibilidades, esperando apenas para ser descoberto.
sexta-feira, maio 03, 2024
meu menino
a correr, pé no chão
vejo hoje quem sou
e seguro sua mão
tanto tempo já passou
sonhos deixados para trás
mas o menino alertou:
sonhos não saem de cartaz
pega tua criança
veste aquela fantasia
que te trouxe até aqui
e vai cultivar tua alegria!