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domingo, novembro 10, 2019

a hora é agora

vambora, que é hora
de se fazer o amanhã
no agora!

se o capital financeiro
nos quer lépido e faceiro
trabalhar, sem nunca cansar

vamos nos organizar
trazer a mudança ligeiro
o povo é o timoneiro

vambora, que é hora
de se fazer o amanhã
no agora!

segunda-feira, outubro 21, 2019

Abayomi e limonadas


Baixinha e redonda. Cabelos brancos, pernas tortas e riso largo. A experiência dos anos e a prática diária na luta pela sobrevivência lhe havia dado uma habilidade incomum com objetos manuais. Dentre as coisas que mais gostava de fazer eram as bonecas abayomi. A boneca, vendida ou presenteada, sempre permite encontros preciosos entre a artesã e aquele que recebe. Dona Rosa lembra:

- Sabe de onde vem? Era das mulheres escravizadas que rasgavam seus vestidos para fazer bonecas para as crianças nos navios negreiros. Bonito, né?

E uma história emenda na outra, em mil e uma noites sem fim e sempre entremeados por risos.

- Eu não estudei muito não. Eu tinha vergonha. Lembro que quando era pequena e minha professora me ensinou a soletrar: c-ka, c-ke, c-ki, c-ko, c-ku. Ela falava “diz menina.” Eu vermelha, com vergonha. Aí ela me pôs de joelho em cima de caroços de milho pra me incentivar a leitura. Mas eu tinha muita vergonha de falar cu. Ela chamou minha mãe, que me deu uma surra por não obedecer a professora. Tudo por causa do cu.

E torna a gargalhar enquanto suas mãos não param de fazer as pequenas bonecas. Dona Rosa é daquelas que fazem limonadas de todos os limões que a vida lhe dá.

quarta-feira, outubro 02, 2019

eu não tenho planos...

eu não tenho planos
não ando em linha reta
meu peito está aberto
a toda gente que "não presta"

não caibo em caixinhas
minha laia é sem poder
eu não sou boa bisca
mas quero o teu querer

deixem que falem mal
não importa, sempre falam
vamos pelos tortos caminhos
mostrar a alegria dos que amam

quarta-feira, abril 17, 2019

Dança

          A pequena dançava distraída em plena praça pública. Pernas e braços miúdos desenhando o imenso espaço. A roupa suja e rasgada, tornava os movimentos ainda mais esvoaçantes.
          Ali perto, alguém observava a graciosidade e a alegria daqueles movimentos. O homem riu encantado. Afrouxou a gravata e certa ingenuidade, certa infantilidade lhe veio à memória, talvez ecos da infância.
          A menina, ao perceber seu encanto, foi mais próxima e girou, arrancando-lhe um riso escancarado. Ela estende a mão e pede uma recompensa em dinheiro. O homem estranhou, recolheu o sorriso, mas acedeu. Ela recolheu o dinheiro e saiu girando.
          A mãe, que observava à distância, aquiesce com um gesto de cabeça a atitude da pequena.
          A selva tem feras de muitos tamanhos, algumas inofensivas e frágeis, justamente por isso precisam de muita esperteza para sobreviverem.

quinta-feira, março 21, 2019

Frida

Frida, essa ferida
que, em mim, não cala
se abre para outras
mulheres sofridas

Calar, Khalo, jamais!
As dores se somam
mulheres em luta:
mães, irmãs, putas...

Brancas, pretas, gays
todas elas, guerreiras
unidas pra mudar
vencer barreiras

Sou Frida, sofrida
Khalo, não calo
arrenego, nego
a dor, esse calo.

Poconé/MT 09/02/19

domingo, fevereiro 17, 2019

Vale a carne

                                                                Os conservadores podem dormir tranquilos: enquanto existir o carnaval,
                                                                               não haverá nenhuma revolução social no Brasil.
                                                                               Mário Vargas Llosa - Dicionário Amoroso da América Latina

Tudo lhe pareceria insuportável. A vida não fazia sentido. Como chegamos a isso, se perguntava. Seus pensamentos borbulhavam. Muitas eram as questões. Por tudo lhe parecer horrível, conversava apenas consigo mesmo. A cabeça não parava e o próprio pensar tonava-se angustiante e seu ser intragável. É certo que não era boa companhia nem mesmo para si, que dirá para outras pessoas. Como será que estão lhe vendo nesse momento? Havia percebido que alguns vinham se afastando dele nos últimos dias.

Somos seres destrutivos, dizia para si. E procurava em suas atitudes quais eram esses processos que estavam aniquilando a si próprio, levando-o a uma autosabotagem. Estaria afastando as pessoas de propósito? Não tinha nada contra os seus. Não era as pessoas e sim seu país e o mundo como estava. Será que não viam o quadro à sua frente, a realidade que estamos vivendo?

Seu país tão lindo e tão rico e com tanta miséria. Contradições aos baldes. E por que a população não se revolta? Por que acreditam em lideranças que só lhes prejudicam ainda mais? Por que tanta violência? As perguntas não paravam, sua cabeça girava enquanto seu corpo permanecia imóvel no sofá.

Mas era carnaval. Carnaval. A maior festa popular. Respirou fundo. Vestiu a máscara e foi pra rua celebrar o corpo. Deixou no sofá sua cabeça com seus pensamentos, a festa é do corpo. O corpo vibrou e gritou de alegria! 


quinta-feira, fevereiro 07, 2019

O cão e o gato

Faz tempo que essa história ocorreu; no tempo em que os animais falavam.

O cão e o gato, finalmente, se tornaram amigos e decidiram realizar uma viagem juntos, para comemorar.

O cão explicou ao amigo que seria mais rápido se fossem por Ratolândia. Assim, chegariam ao bosque que queriam visitar, dois dias antes. "Porém", explicou o cão, "seria ruim pra você encontrar velhos inimigos. Poderia perder a cabeça e se quer chegarmos ao destino."

-- Ora, meu caro, hoje sou outro. Aquele velho gato desapareceu. Sou educado, refinado, não perco mais meu tempo com coisas bobas, disse o gato enquanto se espreguiçava.

-- Se é assim que pensas, economizaremos uma boa caminhada.

Partiram no dia seguinte bem cedo. Muitas foram as conversas, sobre eles e o mundo, como tinham mudado e quanto o mundo e os demais bichos precisavam mudar.

Na estrada, passaram por muitos bichinhos, a que o gato sempre cumprimentava gentilmente. Era patente a sua transformação aos olhos do cão. Chegaram a Ratolândia antes do tempo aprazado.

O gato, ao avistar o primeiro rato, saiu em disparada no seu encalço, deixando o cão para trás. Este, perplexo, exclamou:

-- A melhor educação não é capaz de transformar o pior dos instintos!

domingo, fevereiro 03, 2019

leva...

            LEVA LEMA
            LEMA VALA
            VALA LAVA
            LAVA LAVE
LAMA LAVE MALA VALE
VALE MALA MELA LAMA
            MELA VELA
            VELA LALA
            LALA VALE
            VALE LAMA
            LAMA VALE
            VALE LAMA

LAMA: ferro, manganês, alumínio, cromo, chumbo, arsênio, cobre, níquel...

segunda-feira, janeiro 28, 2019

vale...

Vale a vida
Antes de ter
Lama? vale.
Entenda o drama
Lama muita
Acaba vidas
Mulheres, bichos, plantas...
Antes da lama
                         VALE
Vale da morte
Agnus Dei
Leva paz aos
Enterrados
                         LAMA


domingo, janeiro 20, 2019

nordeste

o sol rachando o coco
na ponta de lança do caboclo
o rio seco rioseco
secovida seca vida
vida que teima em brotar
ao som do maracatu
enquanto o político urubu
urubupolítico urulítico
segue a saquear
vida a querer minguar
miguarecê flores florescer

a beleza do povo
nos traços nas rugas
craquelar do chão
rugas ondas em multidão
do litoral mar a vila
maravilha!
seca seca sertão
ser tão sertão
tão belo na forma de ser

ser que teima em existir
na ponta da faca
na explosão do bacamarte
na poesia do cordel
no grito de Lampião
na reza à padre Cícero
no cantar de Patativa
no forró xaxado
na roda do cirandeiro
tudo é beleza de meu sertão
sigo teu sou teu
no passo do cavalo-marinho
no pé rachado pisando o chão

tua vida pulsa
é o boi do mar
arranhão da pernada
do capoeira que gira
da Bahia ao Maranhão
tudo é nordestino
alegria desse menino
sempre a rememorar
as belezas do sertão