Chegamos a Rondônia num tempo
em que a terra ainda era um desbravamento selvagem. Eu me lembro como se fosse
ontem. A estrada era de terra batida, serpenteando pela floresta densa e implacável.
O ônibus chacoalhava tanto que, a cada quilômetro, eu sentia como se minha
espinha fosse se partir. Saímos às seis horas da manhã, e a luz do sol mal
tinha despontado no horizonte. O trajeto era uma provação, levando até o
anoitecer para finalmente avistarmos as luzes esparsas da cidade.
Naquele dia específico, a
tensão era palpável. Em uma das paradas forçadas pelo atolamento do ônibus,
fomos abordados pela polícia. Todos no grupo ficaram apreensivos, mas ninguém
tanto quanto o João, um camarada robusto e de poucas palavras que tinha se juntado
a nós na última cidade. Ele não tinha documento e sabia que qualquer problema
com a polícia poderia significar um desvio inesperado e perigoso para seu
destino. Com os policiais se aproximando, João se esgueirou para fora do ônibus
e se escondeu no mato espesso. Nós seguramos a respiração, esperando que
ninguém notasse sua ausência. Felizmente, a inspeção foi rápida e superficial.
Assim que os policiais se afastaram, João retornou, suado e com o coração a
mil, mas aliviado.
A viagem prosseguiu por aquele
mar de árvores e lama. A paisagem era de uma beleza brutal e implacável. Mata
para todo lado, uma extensão interminável de verde que parecia engolir tudo.
Malária era um fantasma sempre presente, rondando-nos. Víamos gente adoecer e
sucumbir à doença quase diariamente. A morte fazia parte do cotidiano, tornando
cada novo amanhecer uma vitória.
No meio dessa vastidão, a vida
se resumia ao essencial. Nossa comida era arroz, feijão e o que a mata pudesse
nos oferecer. Aprendemos a caçar e a pescar, comíamos carne de tatu, de veado,
às vezes um porco do mato. Era uma vida dura, mas havia uma estranha sensação
de liberdade naqueles dias. Estávamos na fronteira do desconhecido, forjando
nosso caminho com coragem e determinação.
Cada viagem à cidade era uma
expedição arriscada, marcada pela incerteza do que poderíamos encontrar pelo
caminho. Mas havia também uma camaradagem, uma solidariedade entre nós, novos
moradores, que fazia com que cada obstáculo fosse um pouco mais fácil de
enfrentar. Rondônia era uma terra de desafios, mas também de oportunidades, e
nós estávamos ali para enfrentá-los, custasse o que custasse.
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